terça-feira, 15 de novembro de 2011

O VIP

Abana a anca e avança o pé esquerdo. Vai acima, arrasta em baixo… avança e repete, vai acima, vai abaixo e pára com a vénia. Luciana e Jussiara ensaiaram a moda até quase à exaustão. Ainda por cima, internadas há semana e meia com males da tripa, está bom de ver que chegavam ao limite do cansaço bem depressa. Por isso ensaiaram quase sempre numa sala pequena, aquela que estava mais à mão e trazia a bondade de não obrigar a grandes correrias. Ainda se cansavam depressa e com pressa tinham de sentar-se para que o fôlego voltasse e o coração se deixasse de tão desaustinada correria. Queriam estar na perfeição para a chegada da pessoa importante. Do VIP. E, se bem que não soubessem o que era isso, sempre lhes explicaram que era pessoa que se passeava na televisão e que era bom de bola, que ia a festas caras, vestia fino e falava grosso.

Quando o Luís chegou, a dança foi feita a preceito tal qual as regras que lhes tinham sido transmitidas nos últimos dois dias pelas educadoras que lhes entretinham os espaços temporais, muitos, entre a sopa de dieta e o lanche de iogurte magro. Coradas, tanto quanto a sua já cor escura permitia ver, dançaram frente a frente com um sorriso daqueles grandes, de orelha a orelha. Não se enganaram uma única vez. E o VIP alinhou na dança que lhe foi feita em exclusivo. Mais: fez-lhes perguntas, ensaiou passos com elas e mostrou-se bem mais desajeitado na dança do que as manas de cor.

Estranho. Não é suposto os VIP saberem de tudo, falarem de tudo, conhecerem de tudo? Este VIP não. O Luís é dos poucos que tendo sido melhor do Mundo, conhecido seja na Ilha de Sukkwan, seja no Bornéu ou ali, na Amadora, se manteve lúcido. Veste simples, fala com todos, habitou-se a que o tratem por tu enquanto trata os outros como entende que deve tratar, com deferência – quando merecem de deferência -, com normalidade quando é para ser com normalidade.

Foi ao hospital garantir que por mais um ano os doutores que vestem um nariz vermelho e alegram corredores e enfermarias vão poder continuar por ali, sabe deus quão roídos por dentro, a espalhar sorrisos. Gargalhadas escancaradas, mesmo, provocadas por quem sabe passar de um momento para o outro de uma cara séria e formal para batatinha, pipoca ou Maria bóia. Nomes aparvalhados que ajudam ao riso.

No Fernando Fonseca, as crianças não têm medo dos palhaços. Ainda bem.

O Luís deu um abraço ao hospital garantindo que os doutores palhaços – assim se chamam os donos dos narizes vermelhos – vão continuar. E quis testemunhar o abraço. Veio de Madrid à Amadora para afagar os mais pequenos – muitos nem o conheciam – e assinar autógrafos e posar para a fotografia ao lado dos mais velhos. Falou à Imprensa, que é próprio de quem é conhecido de lés a lés e saiu com um obrigado. Foi ele que agradeceu ter vindo ao hospital. O Luís é VIP a sério. Chamam-lhe Figo. E é por aí que todos o conhecem.

1 comentário:

Lola disse...

Gente fina é outra coisa:))) As crianças claro.

Flora